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SEJAM BEM VINDOS E BEM VINDAS!!!

Neste blog você encontrará lindas poesias de autores renomados e da minha autoria. Fique a vontade para apreciar e comentar as publicações que mais lhe agradar.
Um abraço!!!
Ana Rosa

sábado, 26 de dezembro de 2009

O sabiá e o gavião


(Patativa do Assaré)

Eu nunca falei à toa.
Sou um cabôco rocêro,
Que sempre das coisa boa
Eu tive um certo tempero.
Não falo mal de ninguém,
Mas vejo que o mundo tem
Gente que não sabe amá,
Não sabe fazê carinho,
Não qué bem a passarinho,
Não gosta dos animá.

Já eu sou bem deferente.
A coisa mió que eu acho
É num dia munto quente
Eu i me sentá debaxo
De um copado juazêro,
Prá escutá prazentêro
Os passarinho cantá,
Pois aquela poesia
Tem a mesma melodia
Dos anjo celestiá.

Não há frauta nem piston
Das banda rica e granfina
Pra sê sonoroso e bom
Como o galo de campina,
Quando começa a cantá
Com sua voz naturá,
Onde a inocença se incerra,
Cantando na mesma hora
Que aparece a linda orora
Bejando o rosto da terra.

O sofreu e a patativa
Com o canaro e o campina
Tem canto que me cativa,
Tem musga que me domina,
E inda mais o sabiá,
Que tem premêro lugá,
É o chefe dos serestêro,
Passo nenhum lhe condena,
Ele é dos musgo da pena
O maiô do mundo intêro.

Eu escuto aquilo tudo,
Com grande amô, com carinho,
Mas, às vez, fico sisudo,
Pruquê cronta os passarinho
Tern o gavião maldito,
Que, além de munto esquisito,
Como iguá eu nunca vi,
Esse monstro miserave
É o assarsino das ave
Que canta pra gente uví.

Muntas vez, jogando o bote,
Mais pió de que a serpente,
Leva dos ninho os fiote
Tão lindo e tão inocente.
Eu comparo o gavião
Com esses farão cristão
Do instinto crué e feio,
Que sem ligá gente pobre
Quê fazê papé de nobre
Chupando o suó alêio.

As Escritura não diz,
Mas diz o coração meu:
Deus, o maió dos juiz,
No dia que resorveu
A fazê o sabiá
Do mió materiá
Que havia inriba do chão,
O Diabo, munto inxerido,
Lá num cantinho, escondido,
Também fez o gavião.

De todos que se conhece
Aquele é o passo mais ruim
É tanto que, se eu pudesse,
Já tinha lhe dado fim.
Aquele bicho devia
Vivê preso, noite e dia,
No mais escuro xadrez.
Já que tô de mão na massa,
Vou contá a grande arruaça
Que um gavião já me fez.

Quando eu era pequenino,
Saí um dia a vagá
Pelos mato sem destino,
Cheio de vida a iscutá
A mais subrime beleza
Das musga da natureza
E bem no pé de um serrote
Achei num pé de juá
Um ninho de sabiá
Com dois mimoso fiote.

Eu senti grande alegria,
Vendo os fíote bonito.
Pra mim eles parecia
Dois anjinho do Infinito.
Eu falo sero, não minto.
Achando que aqueles pinto
Era santo, era divino,
Fiz do juazêro igreja
E bejei, como quem bêja
Dois Santo Antõi pequenino.

Eu fiquei tão prazentêro
Que me esqueci de armoçá,
Passei quage o dia intêro
Naquele pé de juá.
Pois quem ama os passarinho,
No dia que incronta um ninho,
Somente nele magina.
Tão grande a demora foi,
Que mamãe (Deus lhe perdoi)
Foi comigo à disciprina.

Meia légua, mais ou meno,
Se medisse, eu sei que dava,
Dali, daquele terreno
Pra paioça onde eu morava.
Porém, eu não tinha medo,
Ia lá sempre em segredo,
Sempre. iscondido, sozinho,
Temendo que argúm minino,
Desses perverso e malino
Mexesse nos passarinho.

Eu mesmo não sei dizê
O quanto eu tava contente
Não me cansava de vê
Aqueles dois inocente.
Quanto mais dia passava,
Mais bonito eles ficava,
Mais maió e mais sabido,
Pois não tava mais pelado,
Os seus corpinho rosado
Já tava tudo vestido.

Mas, tudo na vida passa.
Amanheceu certo dia
O mundo todo sem graça,
Sem graça e sem poesia.
Quarqué pessoa que visse
E um momento refritisse
Nessa sombra de tristeza,
Dava pra ficá pensando
Que arguém tava malinando
Nas coisa da Natureza.

Na copa dos arvoredo,
Passarinho não cantava.
Naquele dia, bem cedo,
Somente a coã mandava
Sua cantiga medonha.
A menhã tava tristonha
Como casa de viúva,
Sem prazê, sem alegria
E de quando em vez, caía
Um sereninho de chuva.

Eu oiava pensativo
Para o lado do Nascente
E não sei por quá motivo
O só nasceu diferente,
Parece que arrependido,
Detrás das nuve, escondido.
E como o cabra zanôio,
Botava bem treiçoêro,
Por detrás dos nevoêro,
Só um pedaço do ôio.

Uns nevoêro cinzento
Ia no espaço correndo.
Tudo naquele momento
Eu oiava e tava vendo,
Sem alegria e sem jeito,
Mas, porém, eu sastifeito,
Sem com nada me importá,
Saí correndo, aos pinote,
E fui repará os fiote
No ninho do sabiá.

Cheguei com munto carinho,
Mas, meu Deus! que grande agôro!
Os dois véio passarinho
Cantava num som de choro.
Uvindo aquele grogeio,
Logo no meu corpo veio
Certo chamego de frio
E subindo bem ligêro
Pr’as gaia do juazêro,
Achei o ninho vazio.

Quage que eu dava um desmaio,
Naquele pé de juá
E lá da ponta de um gaio,
Os dois véio sabiá
Mostrava no triste canto
Uma mistura de pranto,
Num tom penoso e funéro,
Parecendo mãe e pai,
Na hora que o fio vai
Se interrá no cimitéro.

Assistindo àquela cena,
Eu juro pelo Evangéio
Como solucei com pena
Dos dois passarinho véio
E ajudando aquelas ave,
Nesse ato desagradave,
Chorei fora do comum:
Tão grande desgosto tive,
Que o meu coração sensive
Omentou seus baticum.

Os dois passarinho amado
Tivero sorte infeliz,
Pois o gavião marvado
Chegou lá, fez o que quis.
Os dois fiote tragou,
O ninho desmantelou
E lá pras banda do céu,
Depois de devorá tudo,
Sortava o seu grito agudo
Aquele assassino incréu.

E eu com o maiô respeito
E com a suspiração perra,
As mão posta sobre o peito
E os dois juêio na terra,
Com uma dó que consome,
Pedi logo em santo nome
Do nosso Deus Verdadêro,
Que tudo ajuda e castiga:
Espingarda te preciga,
Gavião arruacêro!

Sei que o povo da cidade
Uma idéia inda não fez
Do amô e da caridade
De um coração camponês.
Eu sinto um desgosto imenso
Todo momento que penso
No que fez o gavião.
E em tudo o que mais me espanta
É que era Semana Santa!
Sexta-fêra da Paixão!

Com triste rescordação
Fico pra morrê de pena,
Pensando na ingratidão
Naquela menhã serena
Daquele dia azalado,
Quando eu saí animado
E andei bem meia légua
Pra bejá meus passarinho
E incrontei vazio o ninho!
Gavião fí duma égua!
(Patativa do Assaré)

Escrava


O que você fez de mim?
Há tempos que me sinto assim?
Escrava do seu amor
Seja na alegria, seja na dor.
Amo a sua existência
Aceito tudo com paciência,
Pois me desoriento sem você.
Seus braços é um abrigo
Perto de você não corro perigo.
Nos seus olhos vejo a vida
O calor do seu corpo cura qualquer ferida.
Sei que sou dependente,
Tranqüila e paciente,
No entanto, sou feliz
Tenho tudo que sempre quis.
Você é a minha luz
Me ilumina, me ama, me seduz...
Pertenço a você com determinação
Es a minha vida, a minha inspiração!
Não tenho medo de amar
De corpo e alma me entregar
Acredito que o amor é eterno
Até o dia que durar.
Ana Rosa

Tudo ou nada


Cansei
Estou colocando um ponto
Não estou mais disposta
A buscar uma melhora
Chega de viver na sombra
De ser uma aparência
Uma estrela apagada
Que apenas sonha em brilhar.
Não quero mais isso
Ou tudo ou nada.
Chega de brigar com o presente
Quero sair da escuridão
Chega de querer ser competente
E viver na solidão.
Chega!
Parei!
Estou cansada!
Não quero mais me consolar
Não quero mais tentar
Não quero mais padecer
Eu preciso viver.
Repito: ou tudo ou nada
Se desta vez a bela rosa
Não se desabrochar completamente
Ela pode se murchar para sempre.
Esta não será mais uma tentativa
Tem que ser definitivamente a saída.
Não aceito mais a posição de vítima
Ou de culpada.
Não aceito sobreviver
Não quero mais as sobras
Não quero viver de migalhas.
Não dá mais para continuar
Caindo e levantando
Aos trampos e barrancos
Empurrando com a barriga.
Agora quero qualidade de vida
Quero viver
Quero criar
Participar
Ser feliz
Crescer, prosperar.
Se não for assim
Não quero mais
Quero viver e não sobreviver.
Não quero mais essa vida morna,
Sem sal, sem perspectiva
Ou andar no mundo da lua
Sonhando que é feliz.
Agora vai ser assim
Ou tudo ou nada
Se não conseguir a qualidade
Que mereço...
Vou me deixar descer
Ao encontro do abismo
Que sempre me perseguiu
E do qual sempre fugir.
Vou pagar prá ver
Ou minha rosa se desabrocha
Exalando sua beleza
E seu perfume para a vida
Ou ela se murchará eternamente
E será esquecida.

Ana Rosa, 23/05/09

Padecer


Qualquer coisa parece demais
Por mais simples e pequena que seja.
Um pedaço importante parece ter sido arrancado
Deixando um vazio que não pode ser preenchido.
O silêncio é tudo que se ouve
Um lamento interno quase se calando
Sentindo apenas o pulsar da respiração
Que resiste, insiste, teima em continuar.
Um peso intenso força o corpo em direção a terra
Como se estivesse sendo puxado pela força da gravidade.
A existência e o nada se confundem
Na solidão de um dia frio.
A noite se aproxima e o desconhecido se escancara
O que fazer, senão esperar o sono
Para com ele se descansar de não fazer nada?
A incerteza e a desilusão povoam o presente
Apenas um ínfimo fio de esperança
Ressoa de vez em quando
Denunciando uma possível alvorada
E um novo renascer.
Não duvido, não protesto
Não tenho força para isso.
Mas ainda espero.
Ana Rosa, 22/05/09

Espelho


Diante de um espelho
Quem você vê?
Seria capaz de reconhecer você?
Se olhar no espelho não para arrumar a roupa,
O penteado ou a maquiagem...
Mas olhar para os seus próprios olhos
E ler seus pensamentos
Sentir a riqueza e beleza deste momento.
Olhar com calma para os seus traços
A cor da pele, o sorriso, os cabelos...
Enxergar seu coração
Deixar falar mais alto a emoção.
Conhecer sua essência
Perceber como é divina a existência.
Sentir se feliz, sentir sua presença.
Um encontro com si mesmo
Que coisa maravilhosa!
Até que em fim!
Converse muito com você
Aproveite esse momento
Há muitos que não conseguem tê-lo.
Pergunte e terás as respostas
Ame você! Enamore-se desta imagem.
Cresça e apareça!
Sinta-se capaz!
Ana Rosa

domingo, 6 de dezembro de 2009

Reverência ao Destino



Falar é completamente fácil, quando se tem palavras em mente que expressem sua opinião.
Difícil é expressar por gestos e atitudes o que realmente queremos dizer, o quanto queremos dizer, antes que a pessoa se vá.

Fácil é julgar pessoas que estão sendo expostas pelas circunstâncias.
Difícil é encontrar e refletir sobre os seus erros, ou tentar fazer diferente algo que já fez muito errado.

Fácil é ser colega, fazer companhia a alguém, dizer o que ele deseja ouvir.
Difícil é ser amigo para todas as horas e dizer sempre a verdade quando for preciso. E com confiança no que diz.

Fácil é analisar a situação alheia e poder aconselhar sobre esta situação.
Difícil é vivenciar esta situação e saber o que fazer. Ou ter coragem pra fazer.

Fácil é demonstrar raiva e impaciência quando algo o deixa irritado.
Difícil é expressar o seu amor a alguém que realmente te conhece, te respeita e te entende. E é assim que perdemos pessoas especiais.

Fácil é mentir aos quatro ventos o que tentamos camuflar.
Difícil é mentir para o nosso coração.

Fácil é ver o que queremos enxergar.
Difícil é saber que nos iludimos com o que achávamos ter visto. Admitir que nos deixamos levar, mais uma vez, isso é difícil.

Fácil é dizer "oi" ou "como vai?"
Difícil é dizer "adeus". Principalmente quando somos culpados pela partida de alguém de nossas vidas...

Fácil é abraçar, apertar as mãos, beijar de olhos fechados.
Difícil é sentir a energia que é transmitida. Aquela que toma conta do corpo como uma corrente elétrica quando tocamos a pessoa certa.

Fácil é querer ser amado.
Difícil é amar completamente só. Amar de verdade, sem ter medo de viver, sem ter medo do depois. Amar e se entregar. E aprender a dar valor somente a quem te ama.

Fácil é ouvir a música que toca.
Difícil é ouvir a sua consciência. Acenando o tempo todo, mostrando nossas escolhas erradas.

Fácil é ditar regras.
Difícil é seguí-las. Ter a noção exata de nossas próprias vidas, ao invés de ter noção das vidas dos outros.

Fácil é perguntar o que deseja saber.
Difícil é estar preparado para escutar esta resposta. Ou querer entender a resposta.
Fácil é chorar ou sorrir quando der vontade.
Difícil é sorrir com vontade de chorar ou chorar de rir, de alegria.

Fácil é dar um beijo.
Difícil é entregar a alma. Sinceramente, por inteiro.

Fácil é sair com várias pessoas ao longo da vida.
Difícil é entender que pouquíssimas delas vão te aceitar como você é e te fazer feliz por inteiro.

Fácil é ocupar um lugar na caderneta telefônica.
Difícil é ocupar o coração de alguém. Saber que se é realmente amado.

Fácil é sonhar todas as noites.
Difícil é lutar por um sonho.

Eterno, é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade, que se petrifica, e nenhuma força jamais o resgata.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Nordestino sim, Nordestinado não


Nunca diga nordestino
Que Deus lhe deu um destino
Causador do padecer
Nunca diga que é o pecado
Que lhe deixa fracassado
Sem condições de viver
Não guarde no pensamento
Que estamos no sofrimento
É pagando o que devemos
A Providência Divina
Não nos deu a triste sina
De sofrer o que sofremos
Deus o autor da criação
Nos dotou com a razão
Bem livres de preconceitos
Mas os ingratos da terra
Com opressão e com guerra
Negam os nossos direitos
Não é Deus quem nos castiga
Nem é a seca que obriga
Sofrermos dura sentença
Não somos nordestinados
Nós somos injustiçados
Tratados com indiferença
Sofremos em nossa vida
Uma batalha renhida
Do irmão contra o irmão
Nós somos injustiçados
Nordestinos explorados
Mas nordestinados não
Há muita gente que chora
Vagando de estrada afora
Sem terra, sem lar, sem pão
Crianças esfarrapadas
Famintas, escaveiradas
Morrendo de inanição
Sofre o neto, o filho e o pai
Para onde o pobre vai
Sempre encontra o mesmo mal
Esta miséria campeia
Desde a cidade à aldeia
Do Sertão à capital
Aqueles pobres mendigos
Vão à procura de abrigos
Cheios de necessidade
Nesta miséria tamanha
Se acabam na terra estranha
Sofrendo fome e saudade
Mas não é o Pai Celeste
Que faz sair do Nordeste
Legiões de retirantes
Os grandes martírios seus
Não é permissão de Deus
É culpa dos governantes
Já sabemos muito bem
De onde nasce e de onde vem
A raiz do grande mal
Vem da situação crítica
Desigualdade política
Econômica e social
Somente a fraternidade
Nos traz a felicidade
Precisamos dar as mãos
Para que vaidade e orgulho
Guerra, questão e barulho
Dos irmãos contra os irmãos
Jesus Cristo, o Salvador
Pregou a paz e o amor
Na santa doutrina sua
O direito do bangueiro
É o direito do trapeiro
Que apanha os trapos na rua
Uma vez que o conformismo
Faz crescer o egoísmo
E a injustiça aumentar
Em favor do bem comum
É dever de cada um
Pelos direitos lutar
Por isso vamos lutar
Nós vamos reivindicar
O direito e a liberdade
Procurando em cada irmão
Justiça, paz e união
Amor e fraternidade
Somente o amor é capaz
E dentro de um país faz
Um só povo bem unido
Um povo que gozará
Porque assim já não há
Opressor nem oprimido
Patativa do Assaré

O operário em construção


Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.
De fato, como podia
Um operário em construção
Compreender por que um tijolo
Valia mais do que um pão?
Tijolos ele empilhava
Com pá, cimento e esquadria
Quanto ao pão, ele o comia...
Mas fosse comer tijolo!
E assim o operário ia
Com suor e com cimento
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento
Além uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
Prisão de que sofreria
Não fosse, eventualmente
Um operário em construção.
Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
– Garrafa, prato, facão –
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário,
Um operário em construção.
Olhou em torno: gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem o fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.
Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento!
Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.
O operário emocionado
Olhou sua própria mão
Sua rude mão de operário
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela.
Foi dentro da compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário.
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois além do que sabia
– Exercer a profissão –
O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.
E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.
E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:
Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.
E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.
Como era de se esperar
As bocas da delação
Começaram a dizer coisas
Aos ouvidos do patrão.
Mas o patrão não queria
Nenhuma preocupação
– "Convençam-no" do contrário –
Disse ele sobre o operário
E ao dizer isso sorria.
Dia seguinte, o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu, por destinado
Sua primeira agressão.
Teve seu rosto cuspido
Teve seu braço quebrado
Mas quando foi perguntado
O operário disse: Não!
Em vão sofrera o operário
Sua primeira agressão
Muitas outras se seguiram
Muitas outras seguirão.
Porém, por imprescindível
Ao edifício em construção
Seu trabalho prosseguia
E todo o seu sofrimento
Misturava-se ao cimento
Da construção que crescia.
Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobrá-lo de modo vário.
De sorte que o foi levando
Ao alto da construção
E num momento de tempo
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
– Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem bem quiser.
Dou-te tempo de lazer
Dou-te tempo de mulher.
Portanto, tudo o que vês
Será teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.
Disse, e fitou o operário
Que olhava e que refletia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria.
O operário via as casas
E dentro das estruturas
Via coisas, objetos
Produtos, manufaturas.
Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse: Não!
– Loucura! – gritou o patrão
Não vês o que te dou eu?
– Mentira! – disse o operário
Não podes dar-me o que é meu.
E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração
Um silêncio de martírios
Um silêncio de prisão.
Um silêncio povoado
De pedidos de perdão
Um silêncio apavorado
Com o medo em solidão.
Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fraturas
A se arrastarem no chão.
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão.
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção.

Vinícius de Moraes

Cordel o veado e a galinha

Vou contar uma história
Que no mato aconteceu
Com famílias diferentes
E que muito trabalho deu
Mas foi um caso bonito
Que ninguém mais esqueceu.

Esse caso foi inédito
Ninguém tinha imaginado
Mas como nada é impossível
Prá quem está apaixonado
Um romance aconteceu
Com uma galinha e um veado.

Tudo isso começou
Por causa de uma corrida
A galinha desesperada
Parecia está perdida
Fugindo de uma raposa
Correndo risco de vida

A galinha gritava tanto
Que a raposa já estava surda
Por isso nem percebeu
Que a rival recebia ajuda
De um outro animal
Que via aquela cena absurda

Parecendo um cachorro
Para a raposa assustar
Pulou no meio do mato
Sem medo de aventurar
Fazia qualquer coisa
Para a galinha salvar

Esse bravo cavalheiro
Que não se fazia rogado
Não era cachorro nenhum
Mas um valente veado
Que pela beleza da galinha
Estava embriagado

A ave de tão cansada
Já nem ficava de pé
Pelo veado foi levada
Como um homem leva uma mulher
Para agradecer ao amigo disse:
_Faço o que o senhor quiser.

A galinha passou a noite
No mato com o veado
O amanhecer do dia
Ela tinha esperado
Ele disse ao seu ouvido:
__Eu estou apaixonado.

No outro dia o veado
Para a família foi contar
Que estava namorando
E com a galinha ia casar
Logo foi repreendido:
_Ela não vai te respeitar.

Seu pai logo falou
Tome cuidado com sua vida
Não deixe que esse amor
Lhe cause uma ferida
Todo mundo sabe bem
Que galinha é oferecida.

Ouvir aquelas palavras
Era uma grande ofensa
Ao amor da sua vida
Que esperava a sentença
Disse então para a família:
_Quem ama não ver diferença.

Eu estou apaixonado
E não posso esperar
Se não aceitam meu amor
Também não posso ficar
Vou embora para longe
Para com ela morar

Disse o velho veado:
_O meu filho está perdido
Uma galinha feiticeira
Lhe roubou o sentido
Nem percebe que essa tal
Nem ta usando vestido

Erguendo em sua defesa
A galinha assim falou:
_Eu sou uma moça direita
Me respeite por favor
Em breve nasce de novo
As penas que a raposa arrancou.

A galinha e o veado
Não era um par perfeito
Mas se uniram os dois
Lutando pelos seus direitos
Para viver esse amor
E vencer o preconceito.

Com era novidade
A notícia logo correu
Bicho de toda floresta
Com o fato estremeceu
Mas todos queriam ver
O casal que ali nasceu.

Uma inesquecível festa
Começou a preparar
De tão curiosos que estavam
Nem precisava convidar
Pois todos queriam ver
Com quem o veado ia casar.

A família da galinha
Já a tinha perdoado
Mas mesmo assim ainda dizia
Com certa falta de agrado
_O noivo até que é bonito
Mas sempre vai ser veado.

Não houve quem impedisse
O casamento de acontecer
Apesar da diferença
O amor pode vencer
E a galinha e o veado
Felizes foram viver.

Essa história contou
Um caso do mundo animal
Mostrando que a felicidade
Depende do bem e não do mal
Para dizer também a você
Que no mundo ninguém é igual.

Autora: Ana Rosa

Saudade



Você foi embora
Eu devia ter me preparado
Sabendo que isso aconteceria
Nem devia ter me apaixonado.
Mas como você mesmo dizia
Ninguém manda no coração
Deixei fluir o sentimento
Vivendo essa doce emoção.
Ficar com você foi lindo
Romântico, feliz e prazeroso
Sentir suas mãos pesadas
Tocar seu corpo gostoso.
Hoje estou sozinha
Tentando aceitar a realidade
Tenho que esquecer você
Alguém que amei de verdade.
Porque você foi embora
Queria exclusividade
Deixou para mim somente
O doce sabor da saudade.
Olho dentro de mim
E no meu coração vejo você
Posso até acostumar em ficar longe
Mas não poderei lhe esquecer.
Sei que está distante
Mas ainda lhe digo assim:
“onde você estiver
Não se esqueça de mim”.
Agora me resta apenas
Conviver com a sua lembrança
Ou manter dentro de mim
Uma saudosa esperança.
Não sei na realidade
O que posso esperar
Mas no fundo acredito
Que ainda vou te encontrar.
Ana Rosa20/05/09

Quase


Ainda pior que a convicção do não e a incerteza do talvez é a desilusão de um quase.

É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi.

Quem quase ganhou ainda joga, quem quase passou ainda estuda, quem quase morreu está vivo, quem quase amou não amou.

Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos, nas chances que se perdem por medo, nas idéias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no outono.

Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor não me pergunto, contesto. A resposta eu sei de cór, está estampada na distância e frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos "Bom dia", quase que sussurrados. Sobra covardia e falta coragem até pra ser feliz.

A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai.

Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor, sentir o nada, mas não são. Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o mar não teria ondas, os dias seriam nublados e o arco-íris em tons de cinza.

O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma, apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si.

Não é que fé mova montanhas, nem que todas as estrelas estejam ao alcance, para as coisas que não podem ser mudadas resta-nos somente paciência porém,preferir a derrota prévia à dúvida da vitória é desperdiçar a oportunidade de merecer.

Pros erros há perdão; pros fracassos, chance; pros amores impossíveis, tempo.

De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar alma. Um romance cujo fim é instantâneo ou indolor não é romance.

Não deixe que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo impeça de tentar.

Desconfie do destino e acredite em você. Gaste mais horas realizando que sonhando, fazendo que planejando, vivendo que esperando porque, embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu.
Luis Fernando Veríssimo.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Fidelidade

Ser fiel, ser seguro
É saber se compreender
Sem de olhos abertos andar no escuro
Sentir a realidade
Sem dela querer fugir
Abrir o coração, olhar dentro de si
Mesmo que haja sofrimento
Que seja difícil a decisão
Não se nega um sentimento
Nem se engana um coração
Pois fechar os olhos
Para aquilo que se vê
Podando um sentimento
Que há dentro de você
É a pior traição
Que pode lhe acontecer.
Ana Rosa, 24/02/09